O que muda para o trabalhador com a nova lei da Terceirizao

Interpretar a lei revelar o pensamento, que anima as suas palavras.

Clvis Bevilaqua

Ao findar o ms de maro com as guas fechando o vero, grande alvoroo ocorreu com a sano e publicao da Lei 13.429 de 31 de maro de 2017, com alterao de alguns dispositivos na Lei 6.019 de 1974, que instituiu o regime de trabalho temporrio nas empresas urbanas e adicionou artigos na mesma lei para regular a prestao de servio a terceiros.

Deixando de lado as opinies com conotao poltica, a lei vale desde sua publicao e realidade est posta, e este artigo se busca fazer de forma neutra sem externar qualquer juzo valorativo, analisar as alteraes promovidas a fim de esclarecer a classe trabalhadora comerciria de que o cenrio de terra arrasada que muitas interpretaes aodadas, principalmente quanto a temtica da terceirizao, e que vem causando grande insegurana jurdica para os direitos e garantias dos trabalhadores. Vamos a alguns esclarecimentos:

Toda novidade constante em lei passa a viger no nosso ordenamento jurdico com as normas j existentes, passando a conviver com elas e exigindo interpretao que as harmonizem.
A nova lei no alterou um s artigo da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT), e sim alterou a j existente Lei 6.019 de 1974 que trata da regulamentao do contrato de trabalho temporrio. Assim, destaca-se que os artigos 2, 3 e 9 da CLT, sero aplicados para combater a contratao fraudulenta e em se verificando os requisitos do vnculo de emprego diretamente com a empresa tomadora (pessoalidade habitualidade, subordinao), inevitvel ser o reconhecimento do vnculo empregatcio diretamente com o tomador dos servios.
A redao da Lei 13.429 ambgua e obscura, ao tratar de regime de contrato de trabalho com contrato comercial de terceirizao, como se fossem institutos iguais, quando, efetivamente, so contratos de natureza diversa. A consequncia lgica dessa norma ser diversas interpretaes antagnicas as quais sero pacificadas pela Justia.
Objetiva a nova lei em transferir o risco do negcio do empregador para o empregado, com a precarizao da contratao por meio do contrato de trabalho temporrio e de prestao de servios terceirizados.
Reconhecer a importncia da Justia do Trabalho como guardi das garantias constitucionais quanto a isonomia de direitos sociais.
Ao dirigente sindical caber maior organizao em sua base representativa a fim de combater a fraude trabalhista (pejotizao e terceirizao ilcita), bem como para garantir que os contratos de trabalho temporrio sejam preservados os direitos laborais.
O que muda com a Lei 13.429 quanto ao Contrato de Trabalho Temporrio

A primeira mudana feita foi no art. 1 da Lei 6.019 ao alterar de regime de trabalho para relaes de trabalho com o objetivo de mudar o paradigma da lei que passa de simples regulao de trabalho temporrio para somar pretenso de oferecer regulao ampla tambm para a terceirizao de servios, e que na prtica gerar a substituio da contratao direta e por prazo indeterminado para trabalho temporrio e terceirizado.

O artigo 2 trata do trabalho temporrio, vedando a contratao pela empresa de trabalho temporrio de trabalhadores constitudos por pessoas jurdicas.

Quanto aos requisitos autorizadores para o contrato temporrio a Lei de 1974 trazia duas hipteses para a contratao temporria: a) substituio transitria de pessoal permanente (por exemplo substituio de funcionria em licena maternidade) e b) demanda complementar de servios (exemplificativamente, para suprir necessidades produtivas sazonais, como ovos de pscoa). Agora a inovao trazida pela Lei 13.429/2017 est na segunda circunstncia autorizadora, que passa a ser demanda complementar de servios, oriundas de: a) fatores imprevisveis; b) previsveis que tenha natureza b1) intermitente; b2) peridica; b3) sazonal.

Sobre essa alterao destaco a opinio balizada do magistrado do trabalho Rodrigo Trindade que a demanda complementar decorrente de fator previsvel de mais difcil insero no conceito de situao extraordinria original. A ocorrncia de servios usuais, mas em volume extraordinrio, faz parte do risco de negcio, de modo que no cabe (ou no cabia) a transferncia do risco do empreendimento fora de trabalho, com contratao precria na forma de temporrios. O conceito, como se v, segue altamente indeterminado e, fatalmente, gerar insegurana jurdica. [1].

Em uma afronta a caracterstica do contrato temporrio que a curta durao a Lei amplia o prazo de durao do contrato temporrio para 18 dias prorrogvel por mais 90 dias, ou seja, esse contrato de temporrio no tem nada, pois em um ano de 365 o contrato poder ter a durao de 270, ou seja mais de 70% da totalidade do ano.

Quanto a isonomia salarial entre trabalhadores diretos e os temporrios que realizam o mesmo servio na empresa tomadora foi mantida o tratamento isonmico pleno com a manuteno do art. 12, desde 1974.

O que muda com a Lei 13.429 quanto a Terceirizao

Cabe aqui transcrever a ntegra do art. 4-A, para depois coment-lo:

Art. 4-A. Empresa prestadora de servios a terceiros a pessoa jurdica de direito privado destinada a prestar contratante servios determinados e especficos.

1 A empresa prestadora de servios contrata, remunera e dirige o trabalho realizado por seus trabalhadores, ou subcontrata outras empresas para realizao desses servios.
2 No se configura vnculo empregatcio entre os trabalhadores, ou scios das empresas prestadoras de servios, qualquer que seja o seu ramo, e a empresa contratante.
Terceirizao limitada

Com o acrscimo do art. 4-A pretende permitir que a empresa tomadora possa contratar empresa prestadora de servios terceirizados, ou seja, o dispositivo apenas visa a regular a modalidade terceirizao de trabalho arregimentado por contrato de servios, e para que isso seja legal a empresa prestadora de servios deve realizar servios determinados e especficos.

Portanto, o legislador no quis fixar a terceirizao entre atividade-fim, nem com atividade-meio, assim para que ocorra a terceirizao licita deve a empresa tomadora contratar empresa de prestao de servios terceirizados que exera servios determinado e especfico.

Se o legislador quisesse liberar a terceirizao plena e ilimitada teria feito constar na lei, como o fez no § 3 do art. 9 da mesma lei ao permitir que o contrato de trabalho temporrio pode versar sobre o desenvolvimento de atividades-meio e atividades-fim a serem executadas na empresa tomadora de servios.

Diversamente, no caso de empresa prestadora de servio, essa autorizao mais ampla no consta expressamente, permitindo a interpretao de que a terceirizao continua admitida apenas nos casos de atividades-meio da empresa contratante (tomadora), e a compreenso que a Smula 331 do TST continua valendo.

Sindicato fiscalizador

Probe a empresa contratante a utilizao dos trabalhadores temporrios em atividades distintas daquelas contratadas junto a empresa prestadora de servio.

A prtica da aplicao dessa nova lei com a fiscalizao dos sindicatos laborais vai aparar os excessos da sanha exploradora dos maus empregadores ser contida pela obedincia do ordenamento constitucional quanto a funo da atividade econmica e pelo bom censo do setor patronal que analisar o risco de eventual delegao a terceiros de reas vitais da empresa poder colocar em risco o prprio poder de administrao.

Fica a cargo da empresa tomadora dos servios terceirizados a garantia de condies de segurana, higiene e salubridade dos trabalhadores, contudo torna facultativo oferecer o mesmo servio de atendimento mdico, ambulatorial e de refeio destinados aos seus trabalhadores.

J o art. 5-B refora o entendimento de freios a terceirizao ao indicar como requisito para o contrato de prestao de servios conter a especificao dos servios a ser prestado. Assim, defende o magistrado Trindade que no h, portanto, como a empresa terceirizada ter o mesmo objeto finalstico da empresa tomadora dos servios. O art. 9 do mesmo diploma esclarece que o trabalho temporrio realizado tambm em atividades-fim da empresa. O outro trabalho arregimentado objeto da lei " a terceirizao " no guarda no texto normatizado a mesma expresso, sinalizando que no cabvel a aceitao de sua utilizao. A previso expressa de que o trabalho temporrio pode atuar em atividades-fim da prestadora, e o silncio a respeito do trabalho terceirizado, assinala que no h incidncia dessa excepcionalidade. No cabvel trabalho terceirizado em atividades-fim, conforme compreenso ainda vlida da Smula n. 331 do TST. [2]

A Lei fixou a responsabilidade subsidiria em relao s obrigaes trabalhistas da empresa tomadora dos servios terceirizados durante o perodo em que ocorrer a prestao do servio e pelo recolhimento das contribuies previdencirias.

Um fator a preocupar na lei a permisso de quarteirizao de servios terceirizados ocorrendo quando a empresa de servios contratada pela tomada, subcontrata outra empresa transferindo parte da prestao de servios contratada. Aqui a preocupao quanto ao inadimplemento dos direitos trabalhistas dos empregados da empresa quarteirizada.

A lei possibilita que a prestao de servio terceirizado pode ser desenvolvido tanto na sede da empresa tomadora (sistema fordista), como em outras localidades (sistema toyotismo), contudo a empresa terceirizada contrata os trabalhadores, remunera e dirige o trabalho contratado pela empresa tomadora, havendo gesto desta com os empregados terceirizados configura a terceirizao ilcita com reconhecimento de vnculo empregatcio com base nos artigos 2, 3 e 9 da CLT, pois havendo subordinao haver o reconhecimento do vnculo empregatcio.

Sobre a igualdade salarial no foi estendido aos trabalhadores terceirizados a mesma remunerao da percebida pelos empregados de mesma funo da empresa tomadora ou cliente, fato que reduzir o nvel remuneratrio dos empregados terceirizados.

A lei inaugura novos conceitos indeterminados e no esclarece a exata extenso de direitos assegurados aos j precarizados trabalhadores terceirizados e temporrios em relao aos empregados diretos do tomador de servios.

Concluso

A terceirizao no Brasil visa a reduo de custos e cada intermedirio do trabalho tende a garantir sua lucratividade a partir da diminuio das despesas com a folha de pagamento de seus trabalhadores.

A nova lei no traz segurana jurdica para os trabalhadores terceirizados de ter igualdade remuneratria s dos empregados da tomadora de servios que exercem as mesmas funes.

O empregado da empresa terceirizada ter seu enquadramento sindical de acordo com a atividade econmica da empresa prestadora de servios terceirizado e no da atividade preponderante da empresa tomadora conforme disciplina o art. 581, da CLT.

O movimento sindical sair fortalecido com a nova lei ao exercer sua funo fiscalizatria de defender os direitos de seus representados, com fiscalizao habitual e efetiva, a fim de garantir que a igualdade de direitos entre o trabalhador da tomadora dos servios e da prestadora de servios terceirizados sejam mantidos.

A posio que fica que a Lei 13.429 de 2016 permite a terceirizao para servios determinados e especficos, eis que o legislador no teve a inteno de liberar a terceirizao ilimitada, pois se o quisesse teria consignado na lei. Em suma, a terceirizao no novidade na lide trabalhista nacional e a nova lei apenas admitiu nos casos de atividades-meio da empresa contratante (tomadora), a fim de preservar o padro jurdico bilateral da relao de emprego (empregador e empregado, sem a gesto nessa relao do tomador do servio).

Essas so as primeiras avaliaes sobre o novo ordenamento jurdico que ser muito analisada pelos juristas e pela Justia do Trabalho

Companheiros sindicalistas, fiquemos atentos e vigiai!



Lourival Figueiredo Melo

Sheila Tussi Cunha Barbosa
Diretor Secretrio Geral Assessora de Relaes Institucionais




[1] Trindade, Rodrigo. Lei 13.429 de 2017 e a intermediao de trabalho no Brasil: perspectivas polticas e hermenuticas acesso: 07/abril/2017, em http://amatra4.org.br/publicacoes/artigos/1235-lei-13-429-de-2017-e-a-intermediacao-de-trabalho-no-brasil-perspectivas-politicas-e-hermeneuticas.

[2] Trindade, Rodrigo. Lei 13.429 de 2017 e a intermediao de trabalho no Brasil: perspectivas polticas e hermenuticas acesso: 07/abril/2017, em http://amatra4.org.br/publicacoes/artigos/1235-lei-13-429-de-2017-e-a-intermediacao-de-trabalho-no-brasil-perspectivas-politicas-e-hermeneuticas.

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